Mudando de novo: um quarto só pra mim
Essa semana não tem newsletter. semana que vem, diretamente de um teto só meu, eu mando duas edições. Enquanto isso, um livreto não publicado de 10 anos atrás escrito pra um cuzão qualquer
1. l'amour, esse vírus que se alimenta de massa cinzenta
é ridículo, sabe? eu durmo encolhidinha de um só lado da cama, da MINHA cama, de uma cama onde você jamais esteve.
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eu não sei o que aconteceu que passei de uma piranha sem coração diretamente pra isso aqui em um mês, mas aconteceu e eu não gosto.
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eu não consigo acreditar em nada do que você fala, ao mesmo tempo eu quero acreditar e querendo acreditar me sinto ainda mais idiota porque acho que você mente.
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l'amour, esse vírus que se alimenta de massa cinzenta.
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2. NADA,
eu não te pedi amor, eu não te pedi atenção, eu não te pedi exclusividade, eu não te pedi dinheiro, eu não te pedi NADA. mas você quis dar. você veio e me comeu e me abraçou e me buscou no aeroporto e disse que eu estava acabando com a sua vida, você veio e disse "olha, gostou da sua casa no rio" e "vamos para o méxico" e "vou te depositar uma grana" e "eu quero a sua cama" e "eu quero tudo" . aí você sumiu. não quero mais saber dessa merda, sabia que não tinha nada que me abrir pra ninguém, tinha mais era que ter continuado com medo no coração. maldita hora que eu quis dar naquele quarto de hotel e você veio. maldita hora. ainda bem que não entrou o dinheiro que você quis me emprestar, porque assim eu não te devo nada.
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3. Santa Sangre
Nos conhecemos há três menstruações e enchemos o quarto do hotel de sangue. Sangue nos lençóis, sangue nas paredes, sangue em nós inteiros. O pau dele era algo de extraordinário e eu me apaixonei para nunca mais. Seus silêncios despertavam meus pesadelos e eu sonhava com ele todas as noites. Ele morava na minha cama, ele andava nos meus sapatos, ele cantava minhas músicas e agora era com ele que eu falava. Meu tempo pertencia a ele. Ele era minha pior perspectiva, meu maior medo, minha maior fuga. Ele era o amor romântico do qual eu fugia. Parei de fugir e conheci sua casa, sua cama, sua gata, sua coleção de espadas, sua mudinha de mescalina, ensopei seus lençóis de gozo e de suor e só fui embora porque ele tinha que ir. Ele ocupava os espaços de todos os meus homens e aquilo tinha que acabar. Ele perguntou se já podia dizer que me amava enquanto chupava minha buceta e pensei: é agora. Peguei uma das espadas e cravei em suas costas enquanto gozava e o sangue jorrava. Pode, meu amor. Pode. Eu também te amo. E fui embora sem nem me lavar.
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4. of love
sejamos realistas; nada daquilo vai acontecer. você jamais me visitará ou conhecerá meus amigos, nossa vida jamais será mais do que algumas horas enfiados em um quarto, e será sempre maravilhoso e intenso e os melhores momentos dessa vida e nada mais.
sejamos realistas; dizer que me ama entre as minhas coxas é um artifício pra me enlouquecer, assim como todo o resto. enlouquecer é fácil, saudade enlouquece, especular enlouquece, você sumir enlouquece, sentir seu pau dias depois de ter ido embora enlouquece. você enlouquece.
mas não vai sobrar nada disso. os roxos que você fez nos meus braços enquanto me comia já estão desaparecendo e vai ser assim com você também: desaparecerá aos poucos, sem eu nem perceber, e um dia simplesmente não vai mais estar lá.
o tempo é a regra e essa regra eu não quero quebrar. a qualquer momento, então: adeus, minha farsa preferida.
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5 .as coisas que a gente não tem
o perigo mora na ânsia pelas coisas bestas.
as coisas que a gente não faz.
andar no sol.
acordar junto.
segurar na mão.
seu trabalho.
sua barba,
sua gata.
seu chão.
seu cabelo.
a grandeza do amor mora nas coisas pequenas que a gente não tem.
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6.
você não gosta de mim.
você gosta de mim gostando de você.
você não gosta de mim.
você gosta de quem eu faço você acreditar que é.
você não gosta de mim.
mas eu gosto.
só fugir faz sentido.
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7.
esperei. esperei. esperei.
apanhava por dentro enquanto esperava.
você só veio pra dizer que não viria.
eu só queria você. não pra mim; comigo. eu só queria você querendo estar comigo.
um esforcinho. um gesto. um movimento.
a verdade.
não há "nós". há vocês e eu.
vocês juntos enquanto eu vago pela cidade procurando um resquício do seu cheiro no pescoço dos homens e encontrando apenas a tristeza em seu mais puro estado.
transbordo e me esvaio em sangue.
dói.
que bom que dói.
eu ainda sei sentir essa dor. só não sei mais como reagir a ela.
doer sempre foi o meu caminho. doendo eu sou maior.
não sei de onde vem isso. mas sei que tem que ser assim.
obrigada, então, corazón, por acabar com mais essa vida. por acabar comigo assim. por desaparecer. obrigada.
mas cansei de curtir a angústia,
e agora deu.
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8.
eu nunca gozo de primeira, mas com você eu gozei.
eu nunca durmo de primeira, mas com você eu dormi.
eu nunca gosto de primeira, mas de você eu gostei
eu nunca, nunca sinto falta, mas de você eu senti.
eu nunca, jamais, nunca surto, mas com você eu -
eu nunca mato, nunca,
mas de você eu morri.
morri porra nenhuma.
só acabou a palhaçada.